1.4.11

Encontros

Lendo um interessante trabalho de conclusão de curso de arquitetura, que desenvolve considerações a respeito do papel da arquitetura no cinema, lá pelas tantas me deparo com a relação que o autor ressalta entre a obra de Edward Hopper e Alfred Hitchcock, mostrando, imageticamente, exemplos de situações nas quais as cenas do pintor norte-americano serviram de inspiração ao diretor inglês. A mais famosa delas: a casa de Norman Bates, em 'Psicose', que é, ipsis literis, recriada a partir de uma tela de Hopper.

Hopper - House by the railroad, 1925


Residência de Norman Bates no filme Psicose

Fiquei pensando, a partir daí, em outros exemplos deste tipo de encontro entre dois artistas, nos quais o trabalho de um serve de inspiração ao outro. Há muitos posts atrás, citei uma dessas situações, que envolvia Godard e Bertolucci, respectivamente em 'Band à part' e 'The dreamers'. Ali tratava-se de uma citação, uma homenagem de um cineasta a outro e, ao mesmo tempo, uma forma de salientar que a questão que havia suscitado aquela cena em 1964 havia se tornado ainda mais presente em 2001.
Lembrei então, de outro encontro que gosto muito e que, por não envolver artistas muito conhecidos, normalmente passa despercebido: o encontro entre Jack Vettriano e Leonard Cohen. Não tenho idéia se eles já se encontraram pessoalmente alguma vez, mas são freqüentemente vistos juntos em situações como essas:





Dance me to the end of love - Vettriano, 2006




Her secret life - Vettriano, 2006





O trabalho de Vettriano, na verdade, é profundamente influenciado pela música. Várias de suas telas possuem títulos de canções bastante conhecidas, mostrando o quanto um artista nunca tira nada do nada, o quanto uma obra é sempre o resultado de uma teia de relações que se estabelece na mente de seu criador entre tudo o que a povoa e algo concreto - uma música, um livro, um filme, uma pintura - que ele quer jogar no mundo. Esse é o melhor argumento para justificar que, não importa a área a qual se pertença, o tema que possa nos interessar e o foco dos nossos trabalhos, o conhecimento, qualquer que seja ele, sempre nos trará a possibilidade de estabelecermos ligações inusitadas, construirmos perspectivas inovadoras e aprimorarmos a nossa criatividade...





3 comentários:

  1. interessante a relação das casas pintadas com tinta e com luz. Como se vê, o terror que invoca o situação da solidão (em Hitchcock) reflete a solidão em situação nos quadros de Hopper.

    Gladson Dalmonech

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  2. A solidão das pinceladas do Hopper reverbera muito além de seus quadros. Hitchcock captou isso muito bem, o Altman fez sua homenagem com seu último filme ("A Última Noite") e me recordo que alguns exemplares franceses retomam cenas de pinturas como "People in the Sun" e "A Woman in the Sun". Essa interrelação é preciosa e vai muito além da transposição por si só, como você bem frisou ali em cima.

    Hudson

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  3. Pois é, acho que a solidão sempre será uma questão para a arte, seja ela expressa através de qualquer das suas manifestações. É aquele preciso momento do 'eu' junto apenas dele mesmo, ainda que em meio à uma multidão. Tem terror maior que esse?
    Não é à toa que essa sensação da solidão absoluta inspira tantas obras, tantas imagens e tantas palavras, como essas, lindas, de Alceu Valença:
    "A solidão é fera, a solidão devora.
    É amiga das horas prima irmã do tempo,
    E faz nossos relógios caminharem lentos,
    Causando um descompasso no meu coração"...

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